terça-feira, 4 de maio de 2010

A luta pelo Canyon do Itaimbezinho


A LUTA DE CLÁUDIO PELO ITAIMBEZINHO

Guia de montanhismo ficou assustado com o que acontece em Praia Grande

Em 1963, aos 14 anos, Cláudio Martins cometeu a grande aventura da adolescência. Sozinho, desceu o despenhadeiro do Itaimbezinho pelo chamado vértice do cânion, em Cambará do Sul. Sentia-se desafiado pela trilha quase vertical, que leva ao fundo da fenda gigante, 600 metros abaixo da planície. Muitos morreram nessa tentativa. Faminto e assustado, Martins sobreviveu. Três dias e 5,8 quilômetros depois, saiu na outra ponta, em Praia Grande (SC).

Às 10h de ontem, Martins telefonou para a Redação de Zero Hora. Acordara preocupado com a degradação do Parque Nacional de Aparados da Serra, onde fica o Itaimbezinho, que ele já atravessou 25 vezes. Queria contar o que viu há um mês, na entrada do parque por Praia Grande:

– Estão retirando pedras das margens do Rio do Boi para aterrar uma estrada. Até o curso natural do rio foi alterado.

ZH foi à casa de Martins, na Vila Bom Jesus, em Porto Alegre. Ex-administrador de restaurantes, aposentado, ele é guia de montanhismo. Tem 61 anos e assegura que ainda é capaz de subir montanhas que conhece, como o Aconcágua, na Argentina, o Sajama, na Bolívia, o Huascarán, no Peru. Não fica dependurado em paredões, não usa pinos, não interfere em nada. Segue trilhas com um bastão:

– Faço montanhismo de pé no chão.

E nunca mais repetiria a travessura dos 14 anos, até porque há muito tempo é proibido entrar no Itaimbezinho pelo vértice de Cambará:

– Eu sei que estava errado.

Martins não é contra o asfaltamento de estradas de acesso aos aparados, mas defende uma posição de radicalidade: não deixaria ninguém mais entrar nos cânions do Estado. Que os turistas apreciem as fendas do alto. O que diz ter visto em Praia Grande foi assustador. Retroescavadeiras fuçando nas margens do rio e máquinas triturando as pedras, na localidade de Nossa senhora Mãe dos Homens.

Depois da entrevista com Martins, Zero Hora conversou por telefone com o agrônomo Deonir Zimmermann, administrador do parque. Zimmermann sabe que há extração de pedras perto do Itaimbezinho, num local que estaria fora da área de proteção. Mas prometeu investigar a queixa do montanhista.

Martins vai esperar a resposta. Sente-se credenciado a defender aquele e os cânions. Nos anos 90, participou de faxinas que livraram o Itaimbezinho de lixo acumulado. Impressiona-se com o fato de que fotografa o cânion a cada volta ao lugar e nunca consegue captar a mesma imagem, apesar de tentar repetir os mesmos ângulos e direcionar a lente para os mesmos cenários. Percebe uma transmutação sutil da paisagem a cada visita. Recriam-se ambientes, arbustos, cores, luzes. Convenceu-se de que essa paisagem caleidoscópica somente será salva se for vista da planície.

ZERO HORA

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